Elisabete Borgianni,
membro do Conselho de Especialistas da
Associação, foi a palestrante convidada para primeiro encontro, organizado pelo
Programa de Pós
Graduação em Serviço Social
No último dia 15 de setembro
o Programa de Pós Graduação em Serviço Social da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo – PUC-SP – deu
início à Atividade
Programada “o Serviço Social na área sociojurídica”. Este primeiro encontro
teve como convidada a assistente social judiciária aposentada, ex-presidente da
AASP Brasil e hoje membro do Conselho de Especialistas da Associação, Dra. Elisabete Borgianni. Outros
encontros irão ocorrer em outubro e novembro. A atividade foi coordenada pelas
professoras Maria Carmelita Yazbek e Eunice Fávero. A vice-presidente da AASP
Brasil, Cintia Silva, acompanhou a atividade como ouvinte. Ela estará presente
nas demais atividades programadas sobre o tema (veja datas no final do texto).
Elisabete iniciou sua fala
contando como escolheu o Serviço Social como profissão e a influência que sua
vida familiar teve nesta trajetória. Ainda menina teve que lidar com a doença
psiquiátrica de sua mãe e com o diagnóstico posto pelos médicos de que ela
passaria a vida em sanatórios e que a patologia seria herdada pelas filhas
mulheres da família, o que obviamente não veio a se confirmar, mas que, como um
simples “diagnóstico especulativo” poderia ter causado-lhe muitos danos em seu
desenvolvimento como pessoa.
Outro paradoxo que viveu foi
no esporte. Elisabete cresceu jogando tênis e chegou a representar o Brasil em
competições internacionais. Ela praticava um esporte de elite e via os meninos
pobres trabalhando nas quadras, recolhendo as bolinhas para os jogadores. Meninos
que passavam fome ficavam horas debaixo do sol recolhendo as bolas para os
esportistas que se entretinham com o esporte. Esta situação, somada à
experiência daquilo que se afirmava sobre a patologia materna, fez a
profissional pensar que era preciso intervir de alguma forma, ela não poderia
simplesmente se conformar com as realidades impostas.
E foi aí que decidiu cursar
Serviço Social. “Eu escolhi o Serviço Social, não foi um acaso na minha vida.
Eu olhava para o cenário de profissões e pensava: qual será o lugar onde eu
possa ganhar a vida me envolvendo para fazer diferente do que as coisas são,
buscando a ‘justiça social’?”, explicou.
O
sentido do Serviço Social
Diante da escolha da
profissão que queria seguir, Elisabete pontuou que uma das coisas que mais a
marcou foi um artigo escrito pela professora Raquel Raichelis, no qual a autora
abordava justamente a questão “por que as pessoas escolhem seguir o Serviço
Social”. Neste trabalho Raquel demonstrava que as pessoas optavam por esta
graduação justamente por causa deste sentimento de indignação, que de alguma
forma aflorava. “Lembro que a professora Marilda Iamamoto, de quem foi monitora
em seu curso de Graduação, aproveitando
aquele artigo de Raquel, falava
da importância de as pessoas não deixarem este sentimento passar, é preciso
cultivar isso, pois é este sentimento que dá a carne e o
sangue da nossa profissão”, alegou.
Outra lição que Elisabete
diz ter vivido na prática durante sua carreira foi um ensinamento de Marx que
diz que “ser rico não é ter coisas materiais, mas ter ricas necessidades, pois
quando se tem ricas necessidades, o ser social tem de se transformar
cotidianamente para atendê-las e é aí que ele cresce”. Ela tem a constatação de
que o Serviço Social é uma das profissões que mais se depara com ricas
necessidades. “É aquilo que o Sartre dizia: ‘não tem saída, invente-a’. No
Serviço Social estamos cotidianamente confrontados com situações sem saída”,
apontou.
Elisabete falou sobre a rica
experiência que foi fazer a graduação na PUC-SP e como foi sua primeira
experiência profissional, quando foi estagiar em um presidio feminino e ouviu
da diretora: “você vai poder mostrar como é possível com o Marxismo na cabeça
trabalhar com as presas.” E ela abraçou mais este desafio. “Para mim era
fundamental aplicar todo aquele conhecimento adquirido no meu fazer
profissional cotidiano. Não tem sentido um conhecimento que não possa se
objetivar na prática”, afirmou.
O
sociojurídico
A assistente social
apresentou aos ouvintes a definição de área sociojurídica que elaborou para o
Estatuto da AASP Brasil: “Conjunto de espaços sócio ocupacionais onde atuam
assistentes sociais, psicólogos, trabalhadores de áreas afins e operadores do
Direito, nos quais as atribuições privativas e as competências destes
profissionais são mediadas pelo universo jurídico e pelo Direito e onde se
aplicam e executam-se as determinações judiciais ou têm-se interface com as
mesmas”.
Ela apresentou uma linha do
tempo mostrando como o sociojurídico foi se desenvolvendo desde a década de 30
até os dias atuais e usou a expressão “soluços decenais” para mostrar aos
ouvintes como nesta área eventos importantes parecem ocorrer de década em
década. “Isso é ruim, pois parece que as coisas não têm continuidade”, alegou.
Elisabete falou sobre como
funciona o Sistema de Justiça, o papel do assistente social nas instituições
que o compõem e como os profissionais que apesar de não atuarem nestes órgãos
também estão inseridos no sociojurídico por estarem na interface deste sistema.
A especialista usou a
comparação do arado, principal instrumento da agricultura, com o estudo social.
Para ela, o principal instrumento do assistente social deve ser o estudo
social. Assim como o arado, que vai revolvendo a terra, inserindo novos
elementos e preparando-a para o plantio, “o estudo social é o arado que vai
fazer a gente compreender que vai remexer tanto nas relações pessoais, sociais,
as mais profundas, as políticas, as necessidades humanas”, expôs.
Elisabete ainda deixou aos
presentes um conselho: percam o medo da palavra “perito”. Para ela, é preciso
desmistificar o significado deste vocábulo. “Perito é aquele que tem perícia, é
aquele que conhece a fundo uma matéria. Nós todos, não importa onde estamos,
somos peritos em Serviço Social”, apontou.
Uma questão preocupante que
se coloca hoje para os assistentes sociais nesta área é a imposição da
necessidade de se produzir provas pelo Sistema de Justiça. “O tempo todo nos
solicitam provas. Querem prova da negligência, do abuso, etc. O Sistema de
Justiça é baseado em provas. Na área sociojurídica, explicou, “é inevitável que
ocorra uma polaridade antitética entre garantir direitos e responsabilizar
alguém”. É próprio desta área que só se consiga garantir direito pela mediação
de também se responsabilizar alguém”, explicou. E o assistente social precisa
ficar atento a este “nó” porque o assistente social não produz prova e tampouco
tem que atuar na responsabilização, quem produz provas é o delegado de polícia
e seus agentes e o promotor de justiça. O assistente social faz estudo social.
“Este estudo quando entra no processo passa a se chamar prova pericial. É o
nome que o sistema dá, mas eu não fiz como prova pericial, eu não fiz como
investigação criminal”, pontuou.
Outra questão que Elisabete
apontou como importantes para os assistentes sociais desta área: “Devemos ter a
segurança de que somos nós, assistentes sociais, que temos que eleger as
finalidades das nossas ações e as formas de conduzir o nosso exercício
profissional. Ninguém pode determinar como eu vou atuar. Eu tenho que brigar
por isso. Eu escolho os meus instrumentos, eu escolho as formas como vou me
aproximar da população.”
Próximos
encontros:
06/10/2017
– “Criminalização
da pobreza, encarceramento em massa e desafios ao Serviço Social no sistema
prisional” - Andreia Torres
20/10/2017
– “Avanços
conservadores em proposições, marcos legais e práticas judiciais: afetando a
proteção de direitos de crianças , adolescentes e famílias? - Rita Oliveira
27/10/2017
– “Produção
da ‘verdade’, Serviço Social e sigilo profissional : dilemas no cotidiano
profissional no sociojurídico” - Charles
Toniolo e Eunice Fávero
10/11/2017
– “O
exercício profissional no Judiciário: produção e reprodução do controle e da
subalternização dos usuários ou espaço para desvelamento da realidade social
com a finalidade de conquistar e assegurar direitos?” - Eunice Fávero
AASP
Brasil no Youtube
A assessora de comunicação
da AASP Brasil, jornalista Ana Carolina Rios Lopes filmou e editou a palestra
de Elisabete Borgianni. Não deixe de conferir sua exposição no nosso
canal no Youtube.