Especialistas falaram sobre histórico da metodologia, a luta
de resistência e as contradições presentes na aplicação da Lei 13.341/17
No último dia 8 de novembro
o Conselho Regional de Psicologia (CRP-MG) realizou o evento “Psicologia em
Foco: Depoimento especial - Um impasse entre a
escuta psicológica e a inquirição” e convidou para participar da mesa de
debates a psicóloga Esther Arantes e a assistente social judiciária aposentada
Elisabete Borgianni, membro do Conselho de Especialistas da AASP Brasil. Nossa
presidente, Ana Cláudia Junqueira Burd, foi a mediadora dos debates.
Elisabete
falou sobre o funcionamento do Depoimento Especial nos fóruns. “Surgiu com uma
defesa de tese no Rio Grande do Sul, em 2001 e de repente isso se tornou uma
política pública, disseminou-se pelo Brasil e agora virou lei”, apontou. O
Depoimento Especial é um momento de colheita de prova, tanto é que ocorre na
Vara Criminal e não na Vara da Infância e Juventude. Para a profissional, há um
grande desafio que precisa ser pensado nesta situação. A Convenção dos Direitos
da Infância e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) garantem a proteção
para que a criança não seja exposta a nenhuma situação de constrangimento e de
violência. Por outro lado, há também, no Direito Penal, o direito ao
contraditório do réu, que precisa ser garantido. Como o Depoimento Especial é
um momento de colheita de prova, o réu precisa estar presente. “Em um momento
de colheita de prova não existe sigilo, não é como nos nossos estudos, que
depois integram o processo, é uma colheita de provas, então o réu tem o direito
de assistir”, disse. Como existe esta contradição, a saída que acharam foi a de
usar assistentes sociais e psicólogos como interpretes do juiz nas salas de
Depoimento Especial. Essa saída criada, é uma saída criminalizante, que foi
criada com o objetivo único de responsabilização criminal e não para proteção
da criança. “Nós sabemos que em 90% dos casos o abuso sexual ocorre dentro da
família ou em círculos de convivência próximos. Veja que situação é uma criança
fazer uma prova contra alguém das relações próxima a ela”, analisou.
Para
Elisabete, esta metodologia é uma colonização do Serviço Social e da
Psicologia pela área do Direito. Ela defendeu que não é papel do assistente
social e do psicólogo inquirir pessoas para extração da verdade. “Nos deixem
fazer nossos estudos sociais, nossas avaliações psicológicas, que são mais
protetivos da criança. Nos deixem trabalhar com os nossos métodos, ninguém tem
que nos dizer o que fazer ou filmar o que estamos fazendo com a criança. Onde
fica a autonomia do profissional se tudo está sendo filmado?”, avaliou.
Para Esther, estamos
enfrentando “uma briga de cachorro grande, pois as forças que se colocam neste
debate têm interesses já muito sedimentados. Se nós não nos unirmos, não vamos
dar conta”, expôs. A psicóloga explicou que a Lei 13.341/17 foi aprovada às
pressas e sem o devido debate. Ocorreu em um período de comoção por conta de um
estupro coletivo ocorrido no Rio de Janeiro à época. “Não se pode aproveitar uma situação de calamidade pública para se votar
uma lei que vai mudar a vida de todas as crianças e adolescentes no Brasil.
Isso é oportunismo”, alegou. “A questão aqui não é quem quer proteger a criança
e quem não quer proteger. Partimos do pressuposto de que todos nós queremos
proteger os direitos humanos de crianças e adolescentes. A questão é o próprio sentido do que é
proteger a criança”, acredita a especialista.
Por fim, Esther aponta para
a necessidade de se compreender que escutar e inquirir são dois conceitos
diferentes e que a criança não pode ser responsabilizada pelo ônus da prova.
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